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A COMPLEXIDADE DO MERCADO DE ENERGIA ELÉTRICA NO BRASIL

Indicadores | Indicadores | 27.08.2021




A COMPLEXIDADE DO MERCADO DE ENERGIA
ELÉTRICA NO BRASIL
PARTE 2

No segundo artigo da série “A Complexidade do Mercado
de Energia Elétrica no Brasil”, vou apresentar a
vocês, leitores, alguns aspectos relacionados ao preço
final da energia elétrica do consumidor comum,
ou seja, o consumidor domiciliar e as atividades de comércio e
serviço de micro e pequeno porte. Para os consumidores rurais
e os de grande porte (indústria, comércio e serviços), como é de
se esperar, há um vasto emaranhado de normas para tornar a
atividade empresarial mais difícil.
Conforme foi abordado no artigo da Parte 1 (Revista O Papel
– julho/2021), o mercado de energia elétrica no Brasil possui,
resumidamente, os seguintes atores: usinas geradoras de energia,
empresas de transmissão de energia, companhias de distribuição
de energia elétrica, o consumidor e o ente Estatal (União,
Estados e Municípios). O papel de cada um está sintetizado a
seguir:
• Geração: reúne as usinas que geram energia elétrica utilizando
diferentes tipos de geração (hidrelétricas, termelétricas,
usinas atômicas, fotovoltaicas e eólicas) e os mais diversos
portes. As usinas devem estar conectadas às linhas de
transmissão de energia elétrica.
• Transmissão: engloba as empresas que transportam a energia
elétrica entre a usina de geração e as estações/subestações
de energia. Como a própria ANEEL (Agência Nacional
de Energia Elétrica) define em sua ampla gama de relatórios,
ela optou por deixar este segmento como “monopolista”.
• Distribuição: companhias que conectam os consumidores
às estações/subestações de energia. São responsáveis por
realizar a medição do consumo de energia e a cobrança da
tarifa de energia de cada consumidor final. Dependendo da
legislação municipal, também é responsável pela execução e
manutenção da iluminação pública. Assim como na transmissão,
a ANEEL considera este segmento um monopólio
regional para cada empresa participante.
• Consumo: corresponde a todos os consumidores finais de
energia elétrica, pessoa física ou privada, seja ente privado
ou público, de todos os portes e atividades econômicas.
• Regulação, fiscalização e tributação: compreende os entes
federados (União, Estados e Municípios) que realizam em
cada esfera o planejamento, a coordenação e o controle do
sistema nacional de energia elétrica. Implementa normativas,
direciona políticas públicas e determina as alíquotas dos
impostos sobre o consumo.
Também já foi comentado que o sistema normativo que regra
a geração, distribuição e consumo de energia elétrica no País
é complexo e pouco eficiente. Uma das principais explicações
para isso se deve ao fato do centralismo do controle do sistema
nacional, que acaba gerando distorções a cada nova adequação
legal e muito pouca competitividade. Em resumo, o resultado é
uma tarifa elevada para o consumidor e, dependendo da região
do País, um serviço de qualidade contestável (quedas de energia,
oscilações frequentes que provocam a queima de aparelhos
elétricos e impossibilidade de aumento de consumo de energia
elétrica via instalação de novos grandes consumidores).
Um dos conceitos usados pela ANEEL e que demonstra de
forma incontestável a baixa qualidade do setor no Brasil diz respeito
às perdas de energia. São definidos dois conceitos: perdas
técnicas e perdas não técnicas.
• Perdas Técnicas: são perdas de energia que ocorrem naturalmente
ao longo da rede de transmissão (energia elétrica
que se transforma em calor, que se dissipa em núcleos
de transformadores etc.). De concreto, quanto mais longa
a distância de transporte da energia, maior é o percentual
de perdas. O mesmo ocorre pelo uso de equipamentos com
manutenção deficitária ou tecnologicamente ultrapassados.
• Perdas Não Técnicas: considera toda a diferença restante
entre a quantidade de energia gerada e o que é efetivamente
faturado dos consumidores. Entram nessa contabilidade
o furto de energia (“gatos” ou ligações diretas da rede), a
fraude/adulteração de medidores, os erros e/ou incertezas
de medição nas unidades consumidoras e outros.
A Figura 1 mostra o panorama geral de perdas de energia
do SIN (Sistema Interligado Nacional). Infelizmente os dados
disponíveis mais atuais são de 2019. De todo modo, a situação
não é boa. Em termos de Perdas Técnicas, temos atualmente
uma taxa média de 8% para o País, patamar que tem se mantido
estável ao longo tempo. Considerando as diferentes realidades
estaduais, temos uma amplitude significativa deste indicador:
entre 2% e 12%. A mesma Figura mostra uma situação muito
mais dramática no caso das Perdas Não Técnicas, cujo índice
nacional médio é atualmente de 6%, alcançando em alguns estados
36% de perdas.
Caso ambos os percentuais sejam somados (Perdas Técnicas
e Não Técnicas), temos então o percentual de Perdas Totais. E é
nesse cenário que o leitor deve ficar perplexo em saber que, na
média nacional, quase 15% da energia gerada pelo País se perde.
A Figura 2 mostra as diferentes realidades de Perdas Totais de
Energia em cada estado. Vê-se claramente que estados majoritariamente
da região Norte e Nordeste, incluindo o Rio de Janeiro,
são campeões em perdas de energia. No sentido contrário, os
bons exemplos nacionais são o Paraná e Santa Catarina, nesta
ordem. Importante destacar que em dez estados, há presença de
mais de uma companhia distribuidora, por isso nestes é mostrado
uma amplitude de valores.
E como já foi destacado na Parte 1 da série de artigos sobre
o mercado de energia, todos os custos das inconsistências do
sistema e baixa competitividade entre as empresas são pagos
pelo consumidor final. E isso tudo se reflete na Tarifa de Energia
Elétrica.
A composição média da Tarifa de Energia Elétrica brasi-leira pode ser vista na Figura 3. De imediato, se vê que quase
1/3 do custo médio de energia no País se deve à elevadíssima
carga tributária, já que este custo não gera nenhum benefício
direto ao sistema e ao consumidor. O imposto de maior impacto
é o ICMS, de cunho estadual. Mais da metade do valor da
tarifa é composta pelos custos de geração de energia (no artigo
anterior apresentamos uma média nacional atual de cerca
de R$ 235/MW), somados à transmissão, os custos adicionais
de variação de bandeiras tarifárias (quando há necessidade de
ligação das usinas termelétricas vencedoras dos leilões de energia
de reserva) e os custos de iluminação pública. Também entram
nessa conta os subsídios setoriais e de tipos especiais de
consumidores (como agricultura familiar e população de baixa
renda). O restante dos custos se refere à distribuição.

E a complexidade do entendimento do SIN não para por aí.
Além das Bandeiras Tarifárias (que variam entre Verde, onde
não há custo adicional de energia para o consumidor, passando
para Amarela, Vermelha I e Vermelha II, cada qual imputando
acréscimos de preços à tarifa), o País também implementou o
conceito de Posto Tarifário, o que resumidamente é uma variação
do valor da tarifa de acordo com o período do dia. Assim,
parte dos consumidores está sujeito a uma Tarifa Convencional
(cujo valor é fixo ao longo de todo o dia), enquanto parte dos
consumidores está condicionado ao pagamento de diferentes
valores de tarifa ao longo do dia. Esta segunda alternativa chama-
se Tarifa Branca, e prevê custos de energia mais altos para os
períodos de pico de consumo.
A Figura 4 mostra o exemplo da Tarifa Branca adotada por
uma das Distribuidoras de Energia em operação no País. Em
caráter meramente ilustrativo, selecionei a empresa Copel Distribuição.
Importante destacar que os valores mostrados não
contemplam a Taxa de Iluminação Pública e os Impostos. No
exemplo selecionado, a tarifa convencional da empresa é de
R$ 0,56/KW, independente da fase do dia. Já na Tarifa Branca,
o horário entre 18h e 21h representa o pico de preços tarifários,
justamente o momento em que as famílias estão em casa após a
chegada do trabalho e da escola.
Por fim, para encerrar a presente análise, está disponível
na Figura 5 um ranking das tarifas de energia elétrica
de cada estado. Mais uma vez, os valores de impostos e
de iluminação pública não foram acrescidos. Considerando
os valores médios nacionais, o Distrito Federal é o líder
com a menor tarifa de energia elétrica. Cabe destaque para
a elevada Tarifa Branca – Ponta dos estados do Paraná, Rio
Grande do Sul, Santa Catarina e Rio de Janeiro. Estes quatro
estados possuem mais de uma Distribuidora de Energia
Elétrica e a realidade de custos é bastante variável em regiões
dentro do mesmo estado.

Marcio Funchal
A CONSUFOR é uma empresa de consultoria em negócios e estratégias, especializada nos setores da indústria da madeira, papel e celulose, bioenergia, siderúrgico, oresta e agronegócio. Para atender às necessidades do mercado, a CONSUFOR desenvolve serviços de consultoria e pesquisa focando em quatro áreas: Inteligência de Mercado, Engenharia de Negócios, Gestão Empresarial, Fusões e Aquisições.