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O BRASIL PRECISA DE UM PROJETO SÉRIO PARA ENERGIA

Artigos Assinados | Coluna | 27.08.2021




O BRASIL PRECISA DE UM PROJETO
SÉRIO PARA ENERGIA

PELO EMBAIXADOR JOSÉ CARLOS DA FONSECA JR.
Diretor executivo da IBÁ, com assento no Comitê Diretor do The Forests
Dialogue (TFD) e no Advisory Committee on Sustainable Forest-based
Industries (ACSFI), da FAO. Diplomata de carreira, serviu em diversos países
e foi Embaixador em Myanmar. No Brasil, trabalhou na área de Promoção
Comercial e na Secretaria Geral do Itamaraty, por duas vezes no Ministério da
Economia, além de ter sido Deputado Federal pelo Espírito Santo, Secretário
da Fazenda e Secretário da Casa Civil do Governo do ES entre 2015 e 2018

Após duas décadas de uma das maiores crises de
energia do Brasil, o fantasma da falta de eletricidade
volta a bater à porta do País. Não podemos virar
as costas para a urgência do assunto, que pode ter
enormes consequências, especialmente para uma nação que
ensaia uma retomada econômica.
Bancos e corretoras, como XP e Credit Suisse, já divulgaram
suas análises nas quais apontam que uma crise energética no
atual momento seria um limitador de crescimento para o Brasil.
Um triste paradoxo, uma vez que o País desponta como uma
das matrizes energéticas mais limpas do planeta, com cerca de
45% do que é produzido tendo origem em fontes renováveis,
segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Para a Europa,
por exemplo, o tema, ainda objeto de desejo, é um dos
caminhos traçados para que o continente atinja suas metas de
descarbonização nas próximas décadas.
Desde 2001, é bem verdade, o Brasil diminuiu de 85% para
65% sua dependência de hidrelétricas para geração de energia,
segundo a EPE. Apesar da queda nos números, ainda é um volume
que traz riscos. O recente relatório do Painel Intergovernamental
sobre Mudanças Climáticas ( IPCC) alerta para o modo
como as mudanças climáticas irão desregular o fluxo de chuvas,
aumentando a intensidade em determinadas regiões e causando
seca em outras. Não podemos mais esperar pelo incerto.
E, neste anseio pelo rumo correto, não é preciso navegar
por novas rotas. Dentro do próprio território nacional temos
experiências bem-sucedidas, as quais podemos incentivar e
dar escala. O setor de árvores cultivadas é uma luz que ilumina
este caminho, com um trabalho de anos estruturado em
cima de uma fonte renovável e com previsibilidade. Plantadas,
colhidas e replantadas, as árvores cultivadas possibilitam
o planejamento de longo prazo. Ciclos certos, colheita prevista,
matéria-prima garantida.
Não há segredo. O olhar para o amanhã é o diferencial do
setor. Fruto de investimento durante décadas, atualmente a indústria
produz 69% da energia necessária para alimentar suas
plantas fabris. Deste total, 90% tem origem renovável.
Aliás, esta energia limpa tem nome e sobrenome. A maior
parte é proveniente do licor negro (69%), que é resultante do
processo fabril do segmento de celulose e papel e tem como
um de seus elementos a lignina. Ou seja, as fibras, que representam
cerca de 75% das árvores, são utilizadas para produto
final. Já a lignina (25% restantes), hoje tem a finalidade de gerar
energia verde. A biomassa florestal, que por vezes é constituída
de resíduos florestais, como galhos, por exemplo, é a segunda
maior responsável pela matriz energética renovável (20%) desta
agroindústria. Trata-se da economia circular na veia.
A Eldorado, por exemplo, traz todo este discurso para a prática.
A companhia investiu cerca de R$ 400 milhões para levantar
a maior usina de biomassa do Brasil, na cidade de Três Lagoas-
MS. A matéria-prima para geração de energia é composta,
basicamente, por cascas, tocos e galhos, que antes ficavam no
campo. Ou seja, o CO2 no processo de queima é neutralizado
pela nova plantação, que o absorve por meio da fotossíntese.
Assim, a chamada Termelétrica de Onça Pintada tem capacidade
de produzir energia para abastecer uma cidade de 700 mil
habitantes. Toda a produção tem sido destinada ao grid público,
pois que a fábrica da companhia já é autossuficiente. Trata-se de
um bom exemplo.
Claro que não há uma bala de prata. Na urgente e necessária
tarefa de produzir energia e cuidar do meio ambiente é
preciso buscar o máximo de alternativas. Derivados de cana-
-de-açúcar, energia solar e eólica são outras das alternativas.
A companhia WEG, por exemplo, recentemente lançou um
aerogerador para energia a partir da força do vento capaz de
abastecer até 11.200 casas, com ganho de mais de 80% em
relação a modelos anteriores.
Todo este cenário, que é uma realidade dentro do País, demonstra
que o Brasil não precisaria ter voltado à corda bamba,
depois do trauma do apagão de 2001. Não só temos condições
de diversificar nossa matriz e torná-la ainda mais limpa, como
estamos aptos a ser uma referência para o mundo, até mesmo
com capacidade para exportar modelos. Para tanto, precisamos
de investimento e planejamento. O caminho não é simples nem
rápido, porém é o correto, com absoluta certeza.
Precisamos ouvir a ciência, encarar as mudanças climáticas
com a seriedade necessária e desenhar estratégias seguras. São
necessárias metas de médio e longo prazos. Diversificação, inovação
e sustentabilidade devem ser os pilares desta agenda. Não
mais podemos relegar o sistema de energia nacional a projetos
imediatistas ou improvisados. A responsabilidade de nossa geração
é com o futuro da Nação.